Um Chato GPT
O amor da minha vida, amigos para sempre e qualquer outra jura de eternidade são iguais às paixões de carnaval: Não alcançam a quarta-feira de cinzas. E essa certeza vem de casa. Minha filha acabou o ano apaixonada pelo Bruno Mars, mas desistiu do moço e já engatou sua mais nova ligação eterna. Mal começaram as aulas e tá caidinha pelo chatGPT.
A mãe não vê problema, mas eu fico igual à Rita Lee reclamando do tal Roquenrol. A garota está dependendo dele pra tudo e tô vendo o negócio ficar sério. Foi ele quem escolheu o roteiro da nossa viagem de férias, a trilha sonora do carro e tomou meu lugar na ajuda com a lição de casa! Mas, o nocaute veio quando ela me mostrou a redação (maravilhosa e em inglês!) feita pelo camarada. Tinha impressões, comparações e um desfecho invejável para os quinze anos de experiência da minha princesa.
Já escrevi textos fingindo ser outra pessoa, crônicas por encomenda, críticas de filme sem ter assistido inteiro e até compus a marchinha de carnaval do meu bloco em 88, mas não saberia agradar uma garota da idade dela como o chatinho consegue. Meu desafio começa nas limitações de gênero.
Nem minha maior flexibilidade e um caminhão de balas de menta permitiriam beijar as bocas adolescentes soltas por aí. Então não poderia falar de namoro, ficadas e daquele resto do qual prefiro não saber. Ela já se tocou. Sabe do meu ciúme e desaprovação à essa união e daí vem o perigo. Adolescentes adoram amores impossíveis desde Romeu e Julieta. A proibição funciona como cola para o agarra-agarra.
Sou obrigado a reconhecer a existência de afinidades e gostos comuns entre eles. O celular é o elemento chave, o cimento da relação, por isso pretendo explorar essa fraqueza na composição da minha estratégia. Eu só não imaginava receber essa ajuda impensável e inesperada para minha luta. A escola adotou uma espécie de pochete-cofre para tirar o aparelhinho das mãos dela durante as aulas, enquanto a lei não vem. Se a nova regra tiver sucesso vou beijar os pés dos diretores. Eles contribuirão com a natureza e
ajudarão meu ciúme de pai. O importante é a chance oferecida para ela desenvolver seu estilo próprio, a sua marca pessoal, vendo o universo pelos próprios olhos e não pelos registros da tela.
E eu, ganho minha filhota de novo, sem competir com aquele sujeitinho. Mas não vou confessar isso a ela e nem a ninguém. Do meu egoísmo eu mesmo cuido.
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